09 de set. de 2025
A forma como objetos e espaços são organizados em uma exposição — a expografia — é determinante para criar vínculos entre obras, artistas e público. Mais do que um arranjo estético, trata-se de um recurso que comunica, desperta sentidos e constrói diálogos. Na 2ª Bienal das Amazônias, esse trabalho foi conduzido pela arquiteta paulistana Isabel Xavier, que, após seis meses de pesquisas e imersões em diferentes territórios amazônicos, desenvolveu uma proposta marcada por memória, sensorialidade e inclusão.
Mestra em Artes Visuais, doutoranda pela USP, cineasta e diretora de arte, Isabel mergulhou seis meses no universo pan-amazônico para conceber os ambientes do Centro Cultural Bienal das Amazônias (CCBA) que receberiam esta segunda edição. Sua proposta amplia a experiência para além da visão. “Trouxemos materiais com cheiro, como a palha. Na sala de vídeo, por exemplo, esse aroma desperta imediatamente a lembrança da floresta”, explica. Como professora, ela esclarece que uma expografia é, sempre, um conjunto de técnicas que transformam espaços físicos e simbólicos em experiências de arte, comunicação e vivência estética.
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As cores que marcam o espaço foram inspiradas nas casas ribeirinhas de comunidades localizadas em Colares, Abaetetuba, Combu, Cotijuba e Marajó. “Encontramos muito rosa, uma pigmentação intensa que ressoa com as obras da Pan-Amazônia”, comenta Isabel.
Isabel realizou um intenso processo de pesquisa para imprimir as características amazônicas no projeto (Foto: Ana Dias).
A convivência entre artistas e trabalhos diversos também guiou suas escolhas. Um exemplo são as salas vídeo na Bienal, cobertas com palha de miriti pintadas com urucum produzido pelo Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém (MMIB), uma associação de mulheres na ilha de Cotijuba. O miriti também funcionou bem como isolante acústico, o que é muito necessário para as salas de vídeo que convivem em meio ao espaço expositivo, informa Isabel.
Boa parte do mobiliário foi confeccionada em couro vegetal, resultado da extração de látex de seringais desativados de Cotijuba. Estruturas suspensas feitas com fios deste látex, moldam o espaço da exposição e são também um convite aos sentidos do toque e cheiro do látex fresco. O processo, realizado em conjunto com a Datribu, iniciativa que produz com mulheres da ilha biomateriais como fios e tecidos emborrachados, alia sustentabilidade e geração de renda, além do cuidado com uma remuneração justa pelo trabalho realizado. “Pesquisamos materiais que tivessem ressonância com as discussões propostas nesta Bienal e que também valorizassem o território, os biomateriais locais e o impacto que estes geram na sociedade”, diz a arquiteta enfatizando a sociobiodiversidade no projeto.
Segundo a arquiteta, a permeabilidade do espaço expositivo reflete a própria cidade de Belém, sempre marcada pela presença do rio. “Na área destinada aos encontros do programa público, que chamamos de “Sonhário”, utilizamos material reflexivo em rosa e bronze, evocando tanto a atmosfera da cidade quanto a cor dos rios. O espaço é uma arena onde o público consegue se ver refletido, reforçando a construção do sonho em coletividade. Expografia não é só pensar em paredes, mas propor narrativas. É também um exercício de resgate de memória ancestral”, explica.
Um dos diferenciais da 2ª Bienal das Amazônias é a ênfase na acessibilidade. Todo o espaço segue rigorosamente as normas da ABNT-NBR, e entre 10 e 15 obras contam com recursos como tato, braille e audiodescrição. “Poucas instituições no Brasil adotam um cuidado tão avançado. Esse é um trabalho pioneiro, comparável até a práticas internacionais”, afirma a arquiteta.
Com cerca de oito mil metros quadrados distribuídos em quatro pavimentos, o espaço da 2ª Bienal das Amazônias é um dos projetos mais significativos da carreira de Isabel Xavier. A arquiteta também foi responsável pelo projeto da exposição Dos Brasis – Arte e Pensamento Negro (Sesc Belenzinho, 2023), mostrando a diversidade e a centralidade da produção artística negra na história brasileira, e da mostra “O Quilombismo", realizada na Haus der Kulturen der Welt (HKW), um centro cultural em Berlim, na Alemanha. Sua abordagem trazendo narrativas para a arquitetura de exposições reflete sua atuação como cineasta, uma vez que foi responsável pela direção de arte de filmes como “Outono - Um ano inesquecível”, de Lázaro Ramos, e "Meu amigo hindu”, de Héctor Babenco.
Com 74 artistas selecionados, a 2ª edição da Bienal das Amazônias tem patrocínio master do Nubank, Shell e Vale, e patrocínio do Mercado Livre, todos por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura. Conta ainda com o apoio institucional do Instituto Cultural Amazônia do Amanhã (ICAA) e da Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa na Amazônia (FADESP).
2ª Bienal das Amazônias
Local: Centro Cultural Bienal das Amazônias (CCBA) – Rua Manoel Barata, 400, entre Frutuoso Guimarães e Campos Sales, Belém.
Data: até 30 de novembro de 2025.
Entrada gratuita, sem necessidade de agendamento.
Necessário agendar apenas grupos de pessoas, como turmas escolares. O link de agendamento pode ser acessado na bio do Instagram ou no site.
Horários de funcionamento do CCBA: segunda e terça: fechado; quarta e quinta: 9h às 17h; sexta e sábado: 10h às 20h; domingos e feriados: 10h às 15h. A última entrada é sempre uma hora antes do fechamento.
Instagram: @bienalamazonias.
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